No
dia 19 de setembro, a governadora Rosalba Ciarlini decretou "situação de
emergência por seca" em 150 dos 167 municípios do estado. Em novembro, a
Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (Caern) informou que nove
municípios permanecem em colapso no abastecimento. A Caern admitiu que não tem
condições de abastecer a cidade e suspendeu a emissão de faturas aos moradores.
Durante
três dias, o G1 percorreu mais de 1.200 quilômetros de estradas de terra e
asfalto para ver quais são as dificuldades enfrentadas pelos moradores de
Ipueira, Carnaúba dos Dantas, Equador, São José do Seridó, Antônio Martins,
Água Nova, João Dias, Pilões e São Francisco do Oeste. Além da morte de animais
e da destruição de lavouras, foi possível ver que os moradores travam uma luta diária
pela própria sobrevivência, em busca de água potável.
No
domingo (1°), o "Fantástico" mostrou como funcionam os programas que
combatem a seca no Nordeste com caminhões-pipa. O principal responsável pela
distribuição no semiárido do Brasil é o Exército, que paga até R$ 15 mil
mensais para cada um dos 6 mil pipeiros responsáveis por levar água a 835
cidades, em nove estados, para quase 4 milhões de pessoas. Só em 2013, o
governo já gastou mais de meio bilhão de reais no programa. Em dois meses de
investigação, a reportagem encontrou tanques imundos, água contaminada e
entregas que nunca foram feitas.
Com
o nível dos reservatórios muito baixos, a companhia estadual não consegue
distribuir água em todas as cidades. Por conta disso, suspendeu a cobrança das
contas em nove municípios, que dependem da chegada de caminhões-pipa.
"Ninguém mais dá bom dia na rua. Primeiro a gente pergunta se tem água na
caixa", disse a dona de casa Marina Medeiros, de 40 anos. Moradora de
Ipueira, na região Seridó, ela busca água todas as manhãs nas caixas
comunitárias abastecidas pelos caminhões.
A
produtora de vendas Robéria Danielle Dantas, de 27 anos, mora em Carnaúba dos
Dantas e conta que teve que readaptar a vida por conta da escassez de água. A
maior mudança, segunda ela, é não ter conforto para tomar banho. "Não sei
mais o que é tomar um banho decente. Há dois anos, só tomo banho de cuia."
Nas
cidades visitadas, o G1 ouviu várias histórias de sofrimento por conta da seca.
Brigas e ameaças na disputa por um lugar na fila dos chafarizes públicos e das
caixas d'água comunitárias já viraram casos de polícia. Sem água nas torneiras,
o pouco líquido que restou em poços e barragens é barrento e tem mau cheiro,
impróprio para o consumo humano. Quem se arrisca e bebe, adoece facilmente. Os
mais frágeis, como crianças e idosos, sofrem com diarreia e desidratação.
O
comércio de água é o único beneficiado. Há relatos de quem largou a profissão
para vender galões e barris a moradores. O vaivém de caminhões e motocicletas
adaptadas para transportar água já faz parte da paisagem há quase um ano. Quem
tem cisterna também precisa gastar dinheiro para encher os reservatórios. Quem
não tem improvisa com baldes e barris. Vasilhas decoram as calçadas.
Carnaúba
dos Dantas
A
primeira parada do G1 foi em Carnaúba dos Dantas. A cidade fica na região Seridó,
a 220 km de Natal. No caminho, a movimentação de carros-pipa já deu sinais do
quanto a ajuda é necessária. A maioria dos veículos faz parte da Operação Pipa,
programa de responsabilidade do Exército brasileiro.
Segundo
o coronel Marcelo Pellense, coordenador do programa no Rio Grande do Norte, em
113 municípios do estado caminhões foram contratados para levar água aos
desassistidos pela seca. "Toda a água que o Exército fornece é potável,
vem da própria Caern e é apropriada para o consumo. Nas cidades em que a Caern
não tem de onde tirar água, são os municípios que indicam os mananciais. A cada
30 dias, as prefeituras precisam nos enviar relatórios de análise da qualidade
da água", ressaltou o oficial.
De
acordo com o coronel Josenildo Acioli, coordenador da Defesa Civil no Rio
Grande do Norte, o estado mantém caminhões-pipa em 24 municípios que não fazem
parte da lista dos 113 que já são assistidos pelo Exército. Segundo ele, a água
oferecida à população também é apropriada para o consumo.
Ainda
de acordo com Acioli, a água que é fornecida gratuitamente para essas 24
cidades (incluindo João Dias, Pilões e São Francisco do Oeste) pode acabar.
Para evitar que isso ocorra – uma vez que só há recursos para garantir o
fornecimento até o fim de janeiro de 2014 – o órgão está apelando ao governo
federal.
"Protocolamos
em outubro, junto à Secretaria Nacional da Defesa Social, um pedido de mais
recursos. Ainda não tivemos resposta, mas precisamos prorrogar nosso programa
de atendimento por pelo menos mais seis meses. Para isso, são necessários R$
9,2 milhões", afirmou Acioli.
Ipueira
Em
Ipueira, cidade que também fica no Seridó potiguar, os problemas com a falta
d'água se repetem. O colapso no abastecimento levou a prefeitura a instituir um
"cartão vale água". Com ele, cada residência tem direito a 120 litros
de água potável por semana. O controle passou a vigorar há três meses e já
virou caso de polícia. Osawa Brasil, servidor público que controla a
distribuição de água potável, já foi ameaçado de levar uma surra por um
morador.
Ipueira
está com colapso no abastecimento desde agosto. A Caern diz que o abastecimento
só será normalizado quando tiver capacidade de retirar água das barragens da
região.
São
José do Seridó
A
Caern explicou ao G1 que, durante a execução do projeto, a empresa contratada
observou que a geologia do solo, bastante rochoso, impedia o andamento do plano
original. Por isso, em setembro, a obra foi suspensa para uma readequação. As
modificações foram enviadas à Fundação Nacional de Saúde (Funasa), responsável
pela análise e liberação dos recursos, em novembro do ano passado.
Essa
readequação vai custar R$ 400 mil a mais na obra. "Originalmente, os
recursos tinham a ordem de R$ 2,7 milhões, e com a readequação foram para R$
3,1 milhões, tendo sido executado R$ 1 milhão na construção de uma adutora por
gravidade, que está hoje 70% concluída. O dinheiro a ser liberado será usado
para finalizar essa adutora e, ainda, a execução de dois reservatórios
elevados, uma Estação de Tratamento de Esgotos e uma adutora por
recalque", diz a Caern em nota emitida por sua assessoria de imprensa.
Adutoras,
barragens, cisternas e dessalinizadores
A
assessoria de comunicação do governo do estado informou que a governadora
Rosalba Ciarlini preside o Comitê Gestor de Avaliação e de Combate à Seca, que
semanalmente se reúne para monitorar a execução das ações estratégicas
realizadas com o apoio das secretarias estaduais, do Corpo de Bombeiros e da
Defesa Civil. Dentro das ações, está a construção de mais de 700 quilômetros de
adutoras, 3.400 barragens submersas e 17 mil cisternas, além da recuperação de
60 dessalinizadores e da perfuração de mais de 200 poços em vários municípios.
A
comunicação do governo citou como exemplo um incremento de mais 22 quilômetros
de adutora. A perfuração de outros 12 poços no Sistema Adutor Monsenhor
Expedito deve passar a fornecer, nos próximos meses, uma oferta de 750 metros
cúbicos a mais de água por hora, um aumento de aproximadamente 50% na produção,
que deverá beneficiar mais de 240 mil pessoas em 30 municípios da região central
e agreste do Rio Grande do Norte.
Quando
entrar em operação, a adutora Monsenhor Expedito deve fornecer 2.200 metros
cúbicos de água por hora, dobrando sua capacidade. A previsão é que neste mês a
obra inicie sua fase de testes e seja inaugurada em janeiro de 2014.
No
dia 28 de novembro, foi publicada no Diário Oficial da União a transferência de
R$ 13,5 milhões do governo federal para o estado poder contratar obras da
adutora de engate rápido em Pau dos Ferros, na região oeste. Com a publicação,
o governo afirmou que será iniciado o processo de contratação da empresa que
vai realizar as obras da adutora em caráter emergencial. "Os recursos
serão liberados pelo Ministério da Integração, através da Defesa Civil
Nacional, para uma conta específica da Defesa Civil Estadual, que é vinculada à
Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania (Sejuc)", diz a assessoria do
Caern.
"Pelo
projeto, a captação da água será na cidade de Itaú, a partir da adutora do alto
oeste, do subsistema Santa Cruz-Apodi. A adutora, que terá 43 quilômetros de
extensão, levará água até o município de Pau dos Ferros, beneficiando
diretamente 28 mil pessoas residentes na cidade e indiretamente 200 mil pessoas
dos municípios vizinhos, que também usufruem da água de Pau dos Ferros",
acrescentou a assessoria.
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